Minha fama de mau

Minha fama de mau

Na preguiça de me deslocar até um bom restaurante para celebrar meu aniversário a dois, decidi na última hora ver Minha fama de mau, baseado na autobiografia do Erasmo Carlos. Ênfase no baseado, por favor.

Depois de Bohemian Rhapsody, parece que virou moda de vez tratar biografia como obra de ficção, haja vista Marighella. Com o Tremendão não é diferente.

Dito isso, assim como o filme do Queen, Minha fama de mau funciona muito bem como filme. Parafraseando o nosso guia em visita a Windhoek, é tão bom que nem parece cinema brasileiro.

O estilo faz lembrar aqueles filmes britânicos ousados dos anos 90. A direção é muito boa e com uma linguagem pop de altíssimo nível, misturando quadrinhos, imaginação, realismo.

Dizer que Chay Suede convence como Erasmo é pouco. Ele brilha, reinventa e toma posse de um personagem real e célebre. Não se trata aqui da transfiguração de Val Kilmer Rami Malek, mas de um Christopher Reeve ou de um Morgan Freeman.

Gabriel Leone também não se acovardou ao vestir a pele do Rei. E Bruno de Lucca surpreende no papel do escorregadio Carlos Imperial. O elenco como um todo emoldura bem o o universo do protagonista, sem desequilíbrios. Quem aparece dá o seu recado a altura.

Pra não dizer que só falei de flores, a última cena destoa do resto. Típica cinema nacional ou especial da Globo. O recorte do filme, tendo em vista a longa vida do biografado, é bastante curto. Então não há um final propriamente dito. Ao contrário de Bohemian Rhapsody, o roteirista não conseguiu encaixar um bom gancho para fechar a história, optando por uma cena desgarrada e narrativamente forçada e frouxa.

Mas o deslize é rapidamente varrido pra debaixo do tapete pelos créditos finais com filmes caseiros do Tremendão em família.

Por falar em créditos, filme brasileiro tem tantos produtores e patrocinadores, que a apresentação deles no início do filme faz lembrar a época em que toda a ficha técnica vinha no início. E nada do filme começar…

Suicídio Ideológico

As reações e atitudes nestes dois primeiros meses do ano deixam claras duas coisas. Não que sejam surpresa, mas que poderiam ser nebulosas para quem voltou hesitante em Haddad ou anulou o voto sem saber se estava fazendo a coisa certa.

A primeira coisa é a crise de abstinência de poder. O desespero por perder as vantagens, verbas, canetas. A nossa esquerda debate-se desesperada, impaciente, açodada pela asfixia financeira e, por que não dizer, da ameaça de perder a proteção do STF.

A outra é o comprometimento ideológico. A obrigação de seguir uma determinada cartilha e se alinhar a determinadas políticas coloca a nossa esquerda na contramão de interesses nacionais. Mesmo quando isso afeta a sua própria imagem. A subordinação ideológica impõe limites a certos recuos estratégicos e contorcionismos retóricos. Quando a ordem unida chega, todos devem cumprir.

Tanto num caso quanto no outro, fica evidente que os interesses próprios da nossa esquerda sempre prevalecerão frente às necessidades do país. Essa é uma lição que os ativistas contemporâneos um dia aprenderão: o apoio a sua luta se faz dentro de um lógica utilitária.

Essa lógica utilitária é tão arraigada que transborda para além das lutas políticas e sociais, impregnando também o comportamento individual. É uma filosofia totalitária e, por isso, já não se percebe mais os limites entre as coisas.

Por isso me preocupa que o governo Bolsonaro seja construído nessas mesmas bases. Torço para que o bom senso, eventualmente, prevaleça.

Manifesto do Mico

“Denunciamos a intervenção imperialista dos Estados Unidos, com o bloqueio econômico e sequestro de bilhões de dólares que estão nos bancos americanos. Repudiamos a ameaça de intervenção militar na Venezuela. Repudiamos as declarações intervencionistas do presidente Jair Bolsonaro e seu chanceler Ernesto Araújo, que rompem com a tradição diplomática brasileira em busca da paz, diálogo e integração regional.”

Esse é o manifesto em solidariedade ao governo venezuelano lançado pelo PT, PSB, MST, CUT e afins.

Que o PT continue se afundando em gestos assim, pois nos garante que tão cedo não retornará ao poder. Ou que, melhor ainda, se extinga por obsolescência.

Estreia do Ganso

(publicado originalmente em 22 de fevereiro de 2019)

O Flucelona dirigido pelo Guardiniz tem muita posse de bola, mas carece de infiltração no ataque. Precisa chover mais bola na área adversária. E deixa muitos vazamentos na defesa.

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Boa estreia do Ganso. Não decepcionou, nem fez chover. Mas é a certeza de não ver, da parte dele, jogadas bisonhas. Considerando o elenco limitado do Fluminense, a titularidade é certa. Deve ser por isso que veio para as Laranjeiras: a certeza de jogar. Jogador vaidoso, talvez jogar seja para ele, hoje, mais importante do que ganhar títulos sentado no banco.

O Flu chegou a ter 79% de posse de bola em determinado momento. Mas, no primeiro tempo, as chances de gol foram iguais para cada lado. O que diz muita coisa.

Os chutes de fora da área do time foram ridículos, o que mostra uma necessidade de treinar finalizações. Se o Fluminense ganhar essa arma, tornar-se-á uma equipe mais perigosa, pois chances para isso cria de montão.

Quando Pedro retornar, o time pode se mostrar mais presente no ataque, mas não dá pra contar só com um jogador que pode ser vendido no meio da temporada.

E parabéns pra torcida que soube empurrar o time todo o tempo, mesmo no sonolento segundo tempo. Fez falta no domingo passado.

Festa em casa

(publicado originalmente em 20 de fevereiro de 2019)

Meus primos e tios conhecem bem a casa. Alguns, todas as suas fases.

De 1972 a 1976/1977 o mura era baixo, de grade, com três coqueiros, bacupari, cinco jabuticabeiras, saputi, graviola, cinco mangueiras, jaqueira, limoeiro, caqui, dois pés de abiu, goiabeira, pitangueira, bananeiras, fruta do conde e um enorme pé de cajá-manga, uma varandinha voltada para a entrada, que era no meio do muro. Por algum tempo era possível até encontrar galinhas, e cobras atravessando o terreno.

De 1977 a 1985, talvez tenha sido seu período mais movimentados, com grandes festas de Natal, Reveillon, e dos meus irmão. Surgiu a piscina, o salão, o escritório, o portãozinho deslocado para o canto, o alpendre, o pé de cacau, mas já sem o cajá, a goiabeira, o limoeiro, uma das mangueiras e os coqueiros.

De 86 a 2015, o segundo andar, os churrascos de aniversário do meu pai, já sem o bacupari, caqui, graviola, fruta do conde, mas com o jambeiro.

De 2016 pra cá, o novo alpendre, envidraçado, com ar condicionado, o caminho pavimentado substituindo a trilha de pedra.

Para o Michel, este ano marcou sua primeira festinha de aniversário, com os amigos da creche e fora dela, na casa da vovó.

Sempre procuramos fazer na Tijuca porque quase todos moram na região. Mas um imprevisto nos deixou sem opção a não ser apelar para o “Solar dos Andrades”, que depois virou a “Colônia de Férias da Vovó”.

Mas o meu pai, depois de fazer 80, aposentou o churrasco anual. Os meus sobrinhos chegaram à temível adolescência. E então, no atropelo, no improviso, a velha casa volta a vibrar com o riso e o relaxamento já conhecido pela família e alguns amigos.

As crianças corriam pelo quintal, se soltavam, e fizemos uma tour até a “horta do vovô”.

Michel faz aniversário uma semana antes de mim. Aos quatro anos, no mesmo quintal, tirei minhas primeiras fotos com o uniforme do jardim de infância. Naquele mesmo quintal, levava meus soldadinhos para brincar entre as raízes do pé de cajá, assim como Michel leva seu dinossauros para brincar sob o jambeiro.

Não dá pra dizer que é o início de uma nova era, pois a rota é de despedida, mas que seja eterno enquanto dure.

Batendo cabeças

Como disse FHC, todo início de governo é confuso, mas Bolsonaro exagera.

A bateção de cabeça do atual governo pode até ser colocada na conta da saúde do presidente. Sem condições de impor sua presença, ministros e filhos se acham no direito de cantar de galo

Alguns ministros, particularmente os da Casa Civil, Meio Ambiente, Relações Exteriores e Família, são bombas ambulantes.

Tal contexto transforma o governo Bolsonaro em alvo perfeito de críticas e memes. Mas eis que entra em campo a oposição…

Os comentários, declarações e posts da nossa esquerda são tão obscenamente patéticos que faz a turba de Bolsonaro parecer palatável.

Só nos resta agradecer à nossa esquerda por nos lembrar, diariamente, que poderia ser bem pior.

Fluminense estrangeiro

Resolvi dar uma olhada nos técnicos do Fluminense.

Descobri que o clube tem uma tradição (não sei era o padrão na época) de técnicos internacionais: ingleses, húngaros, uruguaios, e até mesmo um paraguaio, um argentino e um dinamarquês.

O que mais me impressionou foi saber que, de 1935 a 1950, os uruguaios dominaram. O Fluminense chegou a ter 6 técnicos uruguaios diferentes. Uma das exceções foi Gentil Cardoso, que marcou época.

Interessante terem parados com os uruguaios justamente após o Maracanazzo.

Outra curiosidade é o Luxemburgo treinou o Flu entre agosto de 86 e janeiro de 87. Juro que não lembrava. Certamente não deixou saudades. Que nunca tivesse voltado!

O Conservador e o Atrasado

(publicado originalmente em 30 de janeiro de 2019)

Elio Gaspari publicou hoje um artigo intitulado “O Conservador e o Atrasado”. De cara, cita FHC citando Sérgio Buarque.

“Fernando Henrique Cardoso gosta de relembrar uma cena na qual o historiador Sérgio Buarque de Holanda discutia o tamanho de algumas figuras do Império e ensinou: ‘Doutora, eles eram atrasados. Nós não temos conservadores no Brasil. Nós temos gente atrasada’.”

Daí em diante, desfila vários casos de atraso do Brasil, da falência das aéreas às tragédias de Mariana e Brumadinho; da resistência à abolição da escravatura ao apoio dos Bolsonaros às milícias.

Como exemplo de conservadorismos que não implicam em atraso, cita Reagan e Thatcher. Apropriadamente, deixa o empresariado moderno do agro negócio fora disso.

Teria sido mais honesto se escrevesse apenas sobre o atraso. Ou que venha, no futuro, a escrever um artigo falando sobre “O Progressista e o Atrasado”. Pois faltou dizer o quanto as nossa esquerda, dita progressista, é igualmente atrasada. Tanto que é cúmplice dos mesmos atrasos, como Mariana e Brumadinho, e do apoio velado às facções criminosas, entre outros.

No Brasil temos conservadores, liberais, libertários e progressistas, mas em pouca quantidade. Em larga escala predomina o atraso. A própria concepção de política entre esquerda e direita, ou fascistas e comunistas, já é um grande indicativo do tamanho desse atraso.