Turismofobia

Turismofobia é o típico tiro no pé.
Em Cusco senti isso na pele. Havia uma avidez em tirar o máximo possível dos turistas, por bem ou por mal. Tinha de ficar muito atento a golpes e moedas falsas. Quase todo mundo querendo te enrolar, te passar pra trás. E era palpável o ressentimento no olhar, como se fossem os turistas os responsáveis pelas dificuldades do povo cusquenho.
Na Casa Garcilaso havia uma exposição de todos de Cusco nos 50 ou 60, salvo engano. Parecia mais em ruínas do que Machu Picchu. Nesses casos, turistas deveriam ser tratados como aliados, não inimigos.
É verdade que em algumas cidades, como Paris e Barcelona, os turistas podem ser um estorvo para o dia a dia dos cidadãos. Mas são eles que ajudam a preservar determinadas áreas que, de outra forma, poderiam ser degradas, além da óbvia importância econômica.
Na maioria do casos, o problema não é o turista, nem o turismo, mas a administração política.

Fora Renan!

(publicado originalmente em 2 de fevereiro de 2019)

Enquanto a turma pedia seletivamente o “Fora Cunha”, eu já colocava o “Fora Renan” como prioridade.

Depois, a turma aderiu ao “Fora Temer”, continuando a deixar Renan no olvido. E eu mantive o meu “Fora Renan”.

Depois, ambos trocamos.

A turma que parece não ligar para o Renan aderiu ao “EleNão” e eu ao “PTdenovonão”.

Agora eu volto à programação normal: FORA RENAN!

Promessa do passado

(publicado originalmente em 6 de fevereiro de 2019)

Pegando carona no artigo de hoje do PC, é incrível como os tempos mudam.

Aos 20 anos, Neymar já era tratado como uma realidade, e cobrado como um craque completo. Já o queriam na Copa de 2010, e era o dono do time em 2014, apesar da pouca idade.

Mas já passamos da Copa da Rússia e ainda tratam o “garoto” como uma promessa de supercraque, aguardando seu amadurecimento como jogador.

Oras, ontem Neymar completou 27 anos, ele já é o que é. Já está formado. O que quer que ele poderia ter sido, conforme nossas expectativas, não será mais.

Neymar é um grande jogador, mas não tem mais como se colocar no patamar dos gigantes do futebol.

Globo em mão dupla

Nessa briga de narrativas se a Globo é de direita ou de esquerda, a torcida do Bolsonaro leva alguma vantagem fática.
No início do governo Lula, O Globo se portava como um jornal chapa-branca. Suas duas principais colunistas de política na época serviram mais tarde ao governo petista. Tereza Cruvinel saiu para dirigir a TV Brasil. Helena Chagas foi demitida por se envolver diretamente no caso do Francenildo. Mais tarde virou assessora de Dilma. O jornal só partiu para o ataque quando estourou o escândalo do Mensalão.

Verdade seja dita, o único jornal na época a fazer oposição sistemática ao governo foi o Estadão.

Com Bolsonaro, o jornal partiu para a oposição no dia seguinte ao resultado das eleições. Antes mesmo do capitão assumir o governo.

Qualquer pessoa bem informada ou que tenha frequentado redação de jornal sabe que a maioria dos jornalistas são de esquerda, quando não militantes. A “direita”, no caso, costuma ocupar os cargos de direção.

Quando estagiei no Globo, por exemplo, o editor da área internacional era o Cid Benjamin. O manda-chuva era o Evandro Carlos de Andrade, este sim de direita. Mas ele não se envolvia com o dia a dia da redação. As reuniões de pauta eram chefiadas pelo Luiz Garcia, que poderíamos considerar de centro-esquerda (ao menos para os padrões da época).

Ano passado, o editor da Folha declarou que a maior parte dos jornalistas eram de esquerda e simpatizavam com o Haddad.

Então, imagine o que acontece quando os interesses de direção e redação se alinham…

O Homem

O Jornal Extra publicou um post no qual o sujeito torce pelo fogo (não sei se é alusão ou não ao Botafogo) no incêndio no CT do Flamengo. Eu não vi nada parecido, só sei porque deu no jornal.

Ontem fiquei sabendo que a torcida do Botafogo fez uma musiquinha sacaneando os rubro-negros no triste episódio da queda do alambrado da arquibancada. Mas também nunca ouvi.

O que eu ouvi foi a torcida rubro-negra cantando “uh, vai morrer” enquanto o técnico Ricardo Gomes sofria um AVC e era carregado para a ambulância.

Outra, que eu soube, não sei se foi em jogo da Seleção ou do Flamengo, a torcida em peso chamando o craque Leandro de corno (baseado em fatos reais), fazendo-o sair de campo às lágrimas.

Fico pensando que, se o que aconteceu com a Chapecoense tivesse acontecido com o Corinthians, Palmeiras, Vasco, Grêmio e assemelhados, teríamos ficado sabendo de coisas igualmente lamentáveis.

É a natureza humana.

Quatro

Michel completou 4 anos.

Deve ser a partir de agora que o relógio acelera. De 2015 pra cá foi uma looooonga jornada.

Terminei de ler há poucos dias um livro com uma protagonista difícil de simpatizar. Quando as filhas tinham 5 e 3 anos, ela saiu de casa sem maiores avisos ou explicações. E ficou três anos sem vê-las. Partiu porque precisava se sentir inteira, descobrir seu potencial.

Para muitas mães (e pais), não deve ser difícil se identificar com o sentimento e a urgência. Mas raros são aqueles que se identificarão com a atitude.

Mas ela voltou. E por quê, pergunta uma personagem. Porque ela se deu conta que qualquer coisa que ela fizesse na vida, qualquer obra ou feito, jamais chegaria perto das duas filhas. Elas eram sua obra máxima.

Tenho certeza de que muitos pais e mães se identificarão com isso.

Treinadores Tricolores

Resolvi dar uma olhada nos técnicos do Fluminense.

Descobri que o clube tem uma tradição (não sei era o padrão na época) de técnicos internacionais: ingleses, húngaros, uruguaios, e até mesmo um paraguaio, um argentino e um dinamarquês.

O que mais me impressionou foi saber que, de 1935 a 1950, os uruguaios dominaram. O Fluminense chegou a ter 6 técnicos uruguaios diferentes. Uma das exceções foi Gentil Cardoso, que marcou época.

Interessante terem parados com os uruguaios justamente após o Maracanazzo.

Outra curiosidade é o Luxemburgo treinou o Flu entre agosto de 86 e janeiro de 87. Juro que não lembrava. Certamente não deixou saudades. Que nunca tivesse voltado!

Justiça

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Justiça, de Michael J. Sandel, foi publicado em 2009 e foi extremamente badalado e muito recomendado. Estava na minha pilha desde 2012, quando o ganhei de aniversário. Havia chegado a vez dele em 2017, mas Sapiens furou a fila, e depois veio o longo período de pesquisa sobre o Brasil do século XVII e a febre da Elena Ferrante e Alberto Mussa. Mas, enfim, chegou a hora.

Não sei se toda a badalação sobre o livro é justificável, ainda que eu a compreenda. Mas o livro não deixa de ser muito bom e recomendável a qualquer um que pense o ser humano e as sociedades humanas. Porém, para chegar a essa apreciação, eu tive de respirar fundo e engolir toda a minha implicância com a literatura filosófica.

Confesso que, não fosse o livro tão elogiado, teria desistido nas primeiras 50 páginas. Não por ser chato (Sandel em nenhum momento é chato), mas por ser irritante às vezes. O recurso do autor é, todo o tempo, colocar questões éticas e tentar abordá-las de todos os ângulos possíveis. Só que nem sempre ele consegue, e eu via ângulos que ele, digamos, deixou passar.

Outra questão que me exasperou foi a presença de raciocínios forçados, dirigidos de forma a conduzir o leitor à conclusão que o autor deseja, mas deixando lacunas lógicas.

Por fim, logo de cara percebi aonde o autor queria chegar: a importância da questão moral, em apertada síntese.

Ora, se eu conseguia ver aspectos que o autor não viu, perceber furo em seu raciocínio e já sei de antemão qual será a conclusão dele, por que cargas d’água eu o estou lendo? Foi como eu me senti assistindo à série inglesa Sherlock, ao entender o que estava acontecendo muito antes do detetive. E não é isso que você espera ao ver/ler Sherlock Holmes.

Enfim, isso me tornou um “leitor hostil”, aquele que lê já atento para o próximo furo. E eu não gosto disso. Gosto de ler de forma fluida, ser surpreendido pela narrativa ou pelo encadeamento do raciocínio.

Na primeira parte do livro, Sandel apresenta exemplos próprios, clássicos e fáticos para dissecar. Fica evidente para mim a superioridade dos exemplos fáticos para a Filosofia e para o Direito. Qualquer exemplo em que a pessoa tem de abstrair aquilo que ela é ou conhece, ou tem de acreditar na informação dada porque o exemplo assim o exige, é de antemão um raciocínio sem nenhuma serventia prática, pois esterilmente teórica. A ética envolve obrigatoriamente a realidade. Tentar colocar a pessoa numa situação impossível, como faz John Rawls ou o tal exemplo do trem sob a ponte, só pode levar a conclusões falhas.

Mas aos poucos o livro vai decolando. Isso ocorre quando Sandel começa a destrinchar como diversos pensadores pensam o tema “fazer a coisa certa”. Bentham, Mills, Kant, Rawls e Aristóteles. É nítido o desapreço do autor pelo utilitarismo de Jeremy Bentham e o liberalismo de John Stuart Mills e a simpatia por Imannuel Kant e Aristóteles, mas isso não chega a interferir no encadeamento das ideias. O que me pareceu descolado foi as pontes feitas entre filósofos antigos e os tempos modernos.

Um dos problemas dos antigos pensadores é que sua obra reside em como pensam o mundo com o conhecimento que tinham acesso até aquele determinado momento da História. O que pensaria Kant sobre o homem se tivesse tido acesso à obra de Freud, por exemplo? Não se trata de uma questão irrelevante, e é preciso muita cautela ao fazer determinadas conexões. E Sandel escorrega nisso algumas vezes.

Outra pegadinha do pensamento filosófico é que, no frigir dos ovos, tudo se resume à opinião de uma pessoa. Pode ser um gênio e sua obra influenciar gerações, mas ainda assim é a visão que um único indivíduo, em um determinado momento no tempo e no espaço, teve sobre o homem e as sociedades humanas. Portanto, seja qual for a sua visão, ela está impregnada de subjetivismos e valores culturais, ainda que finja não estar.

Dito isso, o grande mérito da Filosofia não está nas soluções ou conclusões que apresenta, mas nas questões que elabora. E nisso reside todo o mérito e importância da obra de Sandel: a forma sagaz com que questiona cada pensamento, cada linha filosófica, vira do avesso, sacode, concorda para logo adiante discordar. Sua grande contribuição, acima de tudo, é revelar como defendemos certas ideias de forma equivocada.

Nos dois últimos capítulos, Sandel se dedica a dar o seu recado: o tal papel do “moralismo”. Ao fazer isso, inevitavelmente escorrega em subjetivismos, encadeamentos forçados e lacunas lógicas, mas dando o mesmo drible de corpo que Caetano com seu “ou não”. Enfim, Sandel é muito feliz ao demonstrar, como um teorema, a relevância da questão moral, que ele chama de “obrigações de solidariedade”, em todos os dilemas da sociedade atual.

No fim, Sandel defende uma política de comprometimento e engajamento moral. Mas, claro, isso não significa que ele esteja certo, por mais que tenha se esforçado em nos convencer de que está. Mas não há quem possa afirmar que ele esteja errado.

Fundo do poço

(publicado originalmente em 28 de janeiro de 2019)

Jair Bolsonaro sofre um atentado no qual quase morreu. Sofreu uma intervenção cirúrgica delicadíssima; teve de usar uma bolsa de colostomia, com a qual esteve na posse, em Davos e em Brumadinho; e agora passa por outra cirurgia delicadíssima, na qual há risco de morte.

A história de seu algoz é envolta em mistério. Ex-filiado do PSOL, com posses incompatíveis com a não renda, e defendido por advogados que não revelam a identidade de seu verdadeiro cliente.

E o que fazem aqueles que pedem rapidez no caso Marielle e esclarecimentos do caso Queiroz? Espalham dúvidas sobre a veracidade do atentado, apelidam o presidente de Bolsococô, fazendo alusão à colostomia e fazem troça do termo mal-ajambrado devido à bolsa.

Claro, são os mesmos que passaram pano na responsabilidade dos governos petistas na tragédia de Mariana e agora tentam colar a imagem do atual governo à tragédia de Brumadinho.

E depois perguntam por que eu ataco tanto a nossa esquerda…